À janela próxima à cabeceira de sua cama, ele olhava amargurado. Olhava de um lado ao outro, mas, ao mesmo tempo, não olhava a lugar algum. Sua expressão era vazia, seu corpo parecia não estar mais ali. Ele queria gritar, mas não encontrava forças para tanto. Queria chorar, mas de dentro dele não conseguia arrancar uma lágrima sequer.
- Isso não é vida – pensava consigo mesmo. Por mais que se esforçasse, não encontrava motivação para continuar vivendo. Por mais que tentasse prosseguir, parecia que algo estava fazendo com que recuasse. Não havia mais o que fazer.
O primeiro pedido que ele fazia todos os dias, assim que acordava, era que, no momento em que abrisse os olhos, estivesse em outro mundo. Este já não lhe dava mais prazer, não trazia mais felicidade. Porém, quando abria os olhos e via o mesmo mundo de sempre, ele se entristecia novamente.
Todo dia era assim. Um segundo de esperança para cada 23 horas, 59 minutos e 59 segundos de amargura. Foi então que ele resolveu partir.
Ele resolveu não contar o plano para ninguém, mas suas atitudes o precediam. Em questão de tempo, todos desconfiavam ou já sabiam do que ele seria capaz para fugir deste mundo. Dentre essas pessoas, estava ela.
Ela não sabia por quê, mas aquilo a sensibilizava profundamente. Ela não o conhecia. Na verdade, ela nunca havia sequer falado com ele em toda a sua vida. Ele, provavelmente, nunca havia ouvido falar dela também. Com o comentário geral do bairro, porém, ela passou a conhecê-lo à distância. Começou a se apegar a ele.
Sempre que o via, percebia sua tristeza e seu desprazer em viver, e aquilo, de alguma forma, a machucava. Ela não aguentava vê-lo daquele jeito, de algum modo, aquilo a machucava demais. De algum modo, a tristeza dele era a sua. De algum modo, ela se sentia como parte dele.
Ela queria fazê-lo feliz, mas via que, neste mundo, seria impossível. Seu coração buscava uma solução. Buscou tanto que encontrou.
No dia seguinte, ela saiu de casa cedo. – Deve ser aqui – disse, conferindo o número que tinha anotado em seu caderninho com o número do prédio em questão.
Ao chegar na portaria, disse ao porteiro que iria ao apartamento daquele que era o motivo de sua preocupação e dono de seus pensamentos.
- Qual o seu nome, por favor? Preciso interfonar para ele. – disse o porteiro.
- Não será necessário, ele está a minha espera. Ele até deixou a porta aberta. – disse ela, de maneira bem convincente.
Chegando no andar desejado, ela conseguiu abrir a porta sem causar alarde. A primeira parada foi na cozinha. Abriu a gaveta e encontrou o objeto que tanto queria.
Finalmente chegou ao quarto, porém ele não estava mais na cama. Seguiu, então, para o banheiro da suíte.
Lá estava ele, de frente ao espelho, com o mesmo olhar vazio. A motivação ainda lhe faltava, a tristeza, como sempre, era aparente. Ele se olhava profundamente, a fim de encontrar um motivo para dar a este mundo uma segunda chance. E encontrou.
Através do espelho, ele viu o rosto dela. E foi como se ele tivesse encontrado um motivo para voltar a viver.
Seu coração bateu acelerado. Não pelo susto, mas por encarar tamanha beleza. Ele nunca havia sentido aquilo antes, mal sabia lidar com tamanho sentimento. E provavelmente nunca saberá.
Por cinco segundos, ele olhou pra ela intensamente. E, quando ia esboçar um sorriso desajeitado, recebeu um golpe nas costas. Uma facada.
Ela apenas o observou caindo no chão. Enquanto ela o observava, disse entre lágrimas:
- Por te amar mesmo sem te conhecer, queria que você encontrasse a felicidade. Se não neste mundo, no outro. Espero ter realizado o seu desejo.
- Não, não realizou – disse ele, com uma lágrima escorrendo de seu olho demonstrando desilusão e desapontamento. A única e última.
2 comentários:
não comentarei para não te xingar. Te odeio.
Jesus amado!!! Que trágico!!! Nossa... sem palavras. Está muito bem escrito, como sempre. Profundo... intenso... dramático... tenso!!!
Parabéns! ;)
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