terça-feira, 20 de julho de 2010

Palavras

­­­­­­Escrever, pra mim, sempre foi assim: pensar, sentir, passar para o papel. É a minha alma ali. Se emociono, bom. Se não, bom também. Ninguém é igual a ninguém, e é isso que faz o mundo ser o que é. Posso falar o mesmo que muita gente, mas não falo igual. Carrego ali o meu sentimento, a minha alma, e é isso que me torna diferente, porém com as mesmas palavras de outrem.

Se existem duas coisas que ninguém pode tirar de você, estas são sonhos e pensamentos. Falar bonito e eloquentemente não é falar bem. Palavras bonitas são as que vêm de dentro. Você pode não usar as palavras consideradas certas, mas são “suas”.

O texto a seguir é um diálogo presente num emprego ingrato. Qualquer semelhança com a realidade, não é mera coincidência.

***

Bom dia, Sr. X. Queira se sentar, por gentileza. Bom, conforme adiantei por telefone, convoquei essa reuniãozinha com o senhor para conversarmos a respeito de seus textos. Li todos eles durante essa última semana.

– Ah, sim, que ótimo. E o que achou? Estão bons?

– Bom, tenho algumas observações, e também umas sugestões para fazer.

(Neste momento, a senhora pega suas anotações. Um bloquinho de cerca de 30 páginas)

– Seu texto tem alguns probleminhas no começo... uns no meio... e mais alguns no fim, mas nada que não possa ser resolvido.

– Nossa... tudo isso? Meu texto inteiro está com problemas?

– Como eu falei, são problemas pequenos, nada que nossa bela e descontraída conversa, de R$100,00 a hora, não possa resolver.

– Puxa vida, R$100,00? A senhora não havia comen...

– Bom, comecemos com este trecho aqui: “Era uma vez...”

– Ah, sim, o começo do meu texto...

– Você deveria trocar essa frase, ela é muito clichê.

– Mas era essa a intenção. Uma história que parece comum e igual, mas que toma um rumo totalmente diferente e surpreendente.

– Mas coisas assim não vendem mais livros, meu querido. A tendência agora é ser original.

– Mas vender livros não é o meu objetivo principal. Eu quero tocar as pessoas que lerem com as palavras que vierem à minha mente.

– Então por que veio até mim?

– Eu pensava que você só iria me auxiliar com o enredo, e não mudar tudo o que eu escrevi.

– Claro que isso faz parte, mas há coisas que também é de minha obrigação recomendar. Certo, então faremos assim: deixaremos o “era uma vez...”, porém o deixaremos com outras palavras. Que tal “numa época longínqua”?

– Mas eu acabei de dizer que...

– É um termo atual e não muito utilizado, mais original. Vai por mim, será melhor para o senhor.

­– Que seja...

– Ótimo! Sabia que iríamos chegar a um consenso. A propósito, completamos uma hora. Continuando...

– Não! Vamos fazer o seguinte... tenho uns compromissos para esta tarde, então... eu ligo! Marquemos para um outro dia.

– Deixa eu só pegar a minha agenda...

– Não! Eu ainda não sei o dia, preciso checar a minha agenda. Mas pode ficar tranquila, te ligo.

– Tudo bem, então. Fico no aguardo.

– Agora preciso ir, foi um prazer encontrar-me contigo.

– O prazer foi meu. Creio que nossos próximos encontros nos renderão muito bons frutos. E por falar nisso, nosso encontro resultou em R$125,00.

– Esses últimos minutos contaram?

– Sim, claro. O pagamento será em cheque ou dinheiro? Só um minuto, o telefone está tocando. Ladra de almas, bom dia...

2 comentários:

Anônimo disse...

sonhos são somente nossos, não deixemos nenhuma ladra carrrega-los...

otimo texto, mais uma vez hehehe.

Mayra Teixeira disse...

"Escrever, pra mim, sempre foi assim: pensar, sentir, passar para o papel. É a minha alma ali." Com certeza, miss. Você consegue fazer isso e muito bem! Parabéns. Texto lindo. E acho que posso dizer que compartilho do mesmo sonho... um dia conseguiremos... ahhhhhh conseguiremos! :P

Postar um comentário