quinta-feira, 13 de maio de 2010

5 segundos

À janela próxima à cabeceira de sua cama, ele olhava amargurado. Olhava de um lado ao outro, mas, ao mesmo tempo, não olhava a lugar algum. Sua expressão era vazia, seu corpo parecia não estar mais ali. Ele queria gritar, mas não encontrava forças para tanto. Queria chorar, mas de dentro dele não conseguia arrancar uma lágrima sequer.

- Isso não é vida – pensava consigo mesmo. Por mais que se esforçasse, não encontrava motivação para continuar vivendo. Por mais que tentasse prosseguir, parecia que algo estava fazendo com que recuasse. Não havia mais o que fazer.

O primeiro pedido que ele fazia todos os dias, assim que acordava, era que, no momento em que abrisse os olhos, estivesse em outro mundo. Este já não lhe dava mais prazer, não trazia mais felicidade. Porém, quando abria os olhos e via o mesmo mundo de sempre, ele se entristecia novamente.

Todo dia era assim. Um segundo de esperança para cada 23 horas, 59 minutos e 59 segundos de amargura. Foi então que ele resolveu partir.

Ele resolveu não contar o plano para ninguém, mas suas atitudes o precediam. Em questão de tempo, todos desconfiavam ou já sabiam do que ele seria capaz para fugir deste mundo. Dentre essas pessoas, estava ela.

Ela não sabia por quê, mas aquilo a sensibilizava profundamente. Ela não o conhecia. Na verdade, ela nunca havia sequer falado com ele em toda a sua vida. Ele, provavelmente, nunca havia ouvido falar dela também. Com o comentário geral do bairro, porém, ela passou a conhecê-lo à distância. Começou a se apegar a ele.

Sempre que o via, percebia sua tristeza e seu desprazer em viver, e aquilo, de alguma forma, a machucava. Ela não aguentava vê-lo daquele jeito, de algum modo, aquilo a machucava demais. De algum modo, a tristeza dele era a sua. De algum modo, ela se sentia como parte dele.

Ela queria fazê-lo feliz, mas via que, neste mundo, seria impossível. Seu coração buscava uma solução. Buscou tanto que encontrou.

No dia seguinte, ela saiu de casa cedo. – Deve ser aqui – disse, conferindo o número que tinha anotado em seu caderninho com o número do prédio em questão.

Ao chegar na portaria, disse ao porteiro que iria ao apartamento daquele que era o motivo de sua preocupação e dono de seus pensamentos.

- Qual o seu nome, por favor? Preciso interfonar para ele. – disse o porteiro.

- Não será necessário, ele está a minha espera. Ele até deixou a porta aberta. – disse ela, de maneira bem convincente.

Chegando no andar desejado, ela conseguiu abrir a porta sem causar alarde. A primeira parada foi na cozinha. Abriu a gaveta e encontrou o objeto que tanto queria.

Finalmente chegou ao quarto, porém ele não estava mais na cama. Seguiu, então, para o banheiro da suíte.

Lá estava ele, de frente ao espelho, com o mesmo olhar vazio. A motivação ainda lhe faltava, a tristeza, como sempre, era aparente. Ele se olhava profundamente, a fim de encontrar um motivo para dar a este mundo uma segunda chance. E encontrou.

Através do espelho, ele viu o rosto dela. E foi como se ele tivesse encontrado um motivo para voltar a viver.

Seu coração bateu acelerado. Não pelo susto, mas por encarar tamanha beleza. Ele nunca havia sentido aquilo antes, mal sabia lidar com tamanho sentimento. E provavelmente nunca saberá.

Por cinco segundos, ele olhou pra ela intensamente. E, quando ia esboçar um sorriso desajeitado, recebeu um golpe nas costas. Uma facada.

Ela apenas o observou caindo no chão. Enquanto ela o observava, disse entre lágrimas:

- Por te amar mesmo sem te conhecer, queria que você encontrasse a felicidade. Se não neste mundo, no outro. Espero ter realizado o seu desejo.

- Não, não realizou – disse ele, com uma lágrima escorrendo de seu olho demonstrando desilusão e desapontamento. A única e última.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Minhas notas de geladeira

METAS:

*Entender a quantas anda o mundo atualmente, e o porquê de ele estar assim. O que era para ser certo, acaba se tornando errado, por maioria de votos. Questionamentos pairam sobre aqueles que não mais pensam em ser bons, pois, com a inversão de valores, nada mais parece ter serventia.

*Reencontrar o amor. Ele nos impulsiona à vida, por mais que se aparente o contrário: os batimentos cardíacos se aceleram, o suor aumenta, o sangue corre mais rápido por entre as veias, a respiração parece cessar. Mas, depois de tudo isso, viver “normalmente” passa a ser desestimulante ou algo vazio.

*Remetendo ao amor, lembrei-me de que também tenho que decifrar os limites entre um amor verdadeiro e uma aventura passageira.

*Saber o verdadeiro valor de uma amizade. Amores são os motores que fazem com que a vida siga, ande; porém, nem mesmo os melhores motores sobrevivem se não forem envoltos por uma lataria: se não forem abraçados e protegidos por uma grande amizade.

*Explodir quando necessário. Mágoas e sentimentos não esclarecidos ou demonstrados são como nódulos que acumulam em nosso corpo; não tratados e retirados, podem virar algo que te machuque e te faça morrer aos poucos.

*Descobrir meu papel no mundo. Seria fazer as pessoas felizes? Seria ajudar, confundir, compreender, ser compreendida? Ressalto que quero descobrir isso ainda no auge de minha juventude... nada de utopia que precede a morte ou coisa assim.

*Buscar a felicidade, mesmo se abstendo de um dos itens acima (salvo terceiro item).

Obs: Os items riscados referem-se aos cumpridos.

Obs²: Os itens em negrito referem-se aos impossíveis. Sem entrega, surpresa e dilema, a vida não prossegue, e o aprendizado não é válido.

domingo, 9 de maio de 2010

Medo

Morte é o medo do qual praticamente a maioria da população sofre. Essa é uma mentira da qual praticamente a maioria da população convive também. A verdade nua e crua é que há um medo maior que a maioria da população sente: o da solidão.

De nada adianta temermos a morte, pois ela é inevitável, vem para todos. A solidão é opcional. Quando digo opcional, não digo apenas sobre a solidão ruim, aquela que você plantou e logo mais colheu. Digo também daquela que vem para o bem, daquela essencial para o seu aperfeiçoamento, crescimento, amadurecimento.

A história que venho lhes contar diz exatamente sobre esse sentimento com o qual nos pegamos diversas vezes, seja onde for, e seus variados tipos.

Houve um Alguém. Este Alguém não tinha amor. Quando digo amor, me refiro àquele que faz o possuidor dele sonhar acordado, e o coração deste mesmo possuidor bater num ritmo descompassado. Apesar desta ausência dentro de si, ele não se sentia infeliz por isso. Pelo contrário, pensava que, muitas vezes, era melhor não sentir coisa alguma do que sentir algo que o fizesse sofrer, deixar aos poucos de viver pra si. Seu amor era outro. Este, infinito e incondicional, era por seus amigos.

Ele pensava que, enquanto tivesse seus amigos, nada mais lhe faltaria. Acabava, deste modo, depositando tudo o que lhe ocorria neles.

Certo dia, Alguém se viu triste. Não sabia exatamente a origem deste sentimento, só sabia que estava ali. Não contou sobre isso aos seus amigos, portanto, sem saberem da existência da tal tristeza, não puderam ajudá-lo. Isto feriu Alguém ainda mais, pois ele achava que, devido a sua devoção total e suprema aos amigos, estes deveriam sentir a presença do sentimento ruim e capturá-lo, eliminá-lo, destruí-lo.

A tristeza tomou conta de Alguém ainda mais, até que ele se viu sufocado por ela e saiu. Correu, fugiu, chorou. Correu tanto que, em um determinado momento, não sabia mais o caminho de volta. Viu-se sozinho. Sozinho por opção.

Não tinha ninguém a quem recorrer. E antes que se visse sucumbido em sua própria solidão, ele parou. Pensou finalmente no óbvio: que ninguém poderia ajudá-lo em algo do qual não tinham conhecimento; que se você preferiu ser sozinho em um aspecto, deve conformar-se com esse vazio, e não disfarçá-lo ou sobrecarregá-lo em outras pessoas, a escolha foi sua; que, mesmo em meio de muitos, você pode ainda se sentir só. Basta, então, parar, encontrar-se, e achar o caminho de volta.

Então Alguém resolveu voltar. Retomou seus passos. Reencontrou o ar do qual tanto sentia falta.

Nem sempre o silêncio diz tudo. Ele, muitas vezes, faz quem está ao redor entender que não há nada a se dizer, e você se vê sozinho. Esse é o caso da solidão opcional ruim. Se você viu-se só e não se deixou ser sucumbido por isso, buscou o caminho de volta para casa, essa é a solidão boa.

A ruim nos vence pelo medo. A boa, nos deixa vencé-la pela luta.